Tuesday, November 26, 2013

Nada para dizer


«Não há o que comunicar. 
Se já sou do esquecimento. 
Dos cafés vazios. Das árvores nuas.
Do arrependimento.

Não há o que dizer.
Se sou como quem vê a juventude e não tem voz.
Se algo sinto é algo que não é meu.
Se algo digo é algo que não sai de mim.
Sinto, esse ser desconexo, eterno em ser fora do contexto.
Sou o movimento que é reflexo de qualquer coisa a mais.

Sinto o que sinto, e não há nada que o faça dizer
Dou e está dado, nada retorna a mim sem querer.
Escorre-me um frio interno que nada de fora me faz exprimir
Palpita-me um peito que chora, que cava fundo de mais e assusta o que de fora,
estivesse para vir.

Sou na vida do emigrado, do refugiado
Refugiada que sou em minha própria vida que prende
Sou de quem sofre e não pode, justificar a si próprio a sua própria dor
Fui enviada para o lugar errado, de uma forma impossível de explicar
E eu fui enviada para guiar, tudo aquilo que eu não sou.

E quem eu sou fica por dizer, engolida e sacrificada.
Parada, sem mais o que fazer do que existir
Vivo num tempo que nem é futuro nem passado nem presente,
é o tempo do viajante parado numa cidade isolada.

E há quem diga que eu devia pedir ajuda
Mas se eu fosse não teria o que dizer
Ou no mínimo não seria compreendida.
Porque sinto o vento e nele ao mesmo tempo estou.

Porque sinto ao contrário do exterior
Sinto para dentro e para fora sou só miragem
Quem me ve como sou não me vê em nada
Eu nem eu própria sou, senao qualquer coisa que paira.

E de mim nunca tenho nada a dizer.»
Luna Marques

Friday, November 15, 2013

O que era suposto.

A noite que é dia para corpos mortos.
O frio que é o calor da dor de tantos porcos.
A ausência que é presença para os que se identificam com a cobertura.
Fui eu quem reneguei tudo isso, quem renegou o musgo do vento, a prata do tempo?

A vida é morte para os que cavam fundo.
A fruta  é amarga para os que escondem o que sofrem
A sina que é sorte para quem se mexe nas migalhas da comida que outros deixaram apodrecer.
Fui eu quem construiu nisso tudo, quem construiu na desconstrução, fui a comunicação do defunto?

A Luz que é a oscilação de maresia,
A Magia do coração que não sabe o porquê do seu toque
O Silêncio que é a voz dos que não tem voz, o idealismo esquecido em nosso pobre viver
Haverá o que desfazer no que já foi feito, haverá cintilar na escuridão, será possivel dizer o que não foi dito, e aparecer sem corpo e sem direcção?

O que foi da distância que vai entre o que existe e o que não existe?
qual foi a aparição da vítima que era a causa da violação?
Será o sistema que cega quem pode provocando a falsa necessidade?
Será o ferir da vontade, o medo de ser alguém mais?
E se falhar for o que houver para fazer.. ?





Thursday, November 14, 2013

Ausência

«Uma vez a mão do vento assim ergueu, uma  mão que sobre mim altera todo um curso de vida
Vi-me, de repente, não mais sozinha,  e sim, entrelaçada  a tua
Num instante, acordei e vi-me sozinha outra vez
Acordei, sem chão, sem teto, sem alma, sem lembrar de repente que sabor poderia ter tido a vida antes de ti
Agora vivo apenas dias e mais dias, dias seguidos  de dormir e sem querer acordar, ou de acordar para ir dormir com pouco de significância e significado entre isso.
São longos dias em que parte de mim continua cegamente  a ansiar-te perdidamente, um anseio que aquela brisa calorosa volte e te traga de novo para junto de mim
Outra parte anseia apenas esquecer, porque concluiu abertamente que na realidade deve deixar-se viver, e andar outra vez ao sabor de outras brisas com novas sensações
E o tempo vai passando, e eu vivendo nesse angustioso ata desata, nesse desato que não sabe se quer desatar ou se prefere continuar atado
No fundo sei que só resta continuar o trilho e deixar te para trás mas não resisto a saborear-te vezes sem conta
Tas ainda na minha mente e só me vejo a esperar, esperar pela brisa que te trouxe de repente da mesma forma que de repente escolheu expulsar-me de ti  
Procuro, e vejo uma busca sem fim, vou a volta de tudo e um pouco mais de nada encontro, tudo o que vejo são miragens, reflexos aparentes de tudo o que tu não és
Mesmo quando imagino acabo, concluo e avesso memórias que nunca aconteceram , tudo o que eu queria era que estivesses para as fazer contigo
Tudo o que eu posso fazer é pôr-te na parte de uma vida a dois que eu criei, um bocado de algo que nunca foi nem será, um passado que não se deixa esquecer e se recusa a deixar de ser repetido
Toda a minha alma esteve completa naqueles segundos de fôlego naqueles segundos de doce fantasia que não volta mais
Foste mesmo aquela pequena brisa apenas, que agora não deixa de ser minha identidade, minha pátria, um retiro, uma verdade e lembranças exageradas por romanescas sensações
“A chama que a vida em nós  criou …a mão do vento pode erquê-la ainda…”
E por isso, assim espero…»

Ausência

Cada nascer do Sol é único, o Sol teu regente num dia ensolarado
fez tua miragem que minha alma acarinhou.
Cada lua, é bênção de amantes, que mesmo distantes um do outro tem sua presença , nua
A lua é nua como o amor é cego a distância próxima de um outro corpo.
E flores, são da doçura, o reflexo da amargura que se sente de um passado
Que é o espelho partido do estado, da alma despedaçada pela flor que murchou.
Nado vivo ou morto, o que eu sou, desses retalhos, pedaços que conto e desconto na minha própria consciência que cegou.
Sou da partida e da chegada, da canoa e do caminho que nem percorrido se torna descrito, que se quer escrever e agarrar o que estragou,
Quer ser nuvem, que dá para ser a ressurreição na verdade da infância que se sonhou.
Que cores tenho na mão, da sina que me contaram para eu não revelar quem sou?
Que tempo guardo ainda no peito, se tanto passado fez gastar a pouca vida que restou?
Que tinta existe ainda para usar, se sou como cinza, a cinza viva duma chama caída,
Pedra que pensa ter sido mais num passado distante. Pétala que não sabe da própria flor.
Dor que vive no silêncio da fala que faz o coração bater,
Sombra do que criou, destruiu, nasceu, e é cego na própria pureza.

Fui cega,  nunca a mim fiz nascida, de repente foi a minha pele quem mentiu. O lar foi fantasma para o sangue.
Perdi.

Friday, November 08, 2013

Escolhas...


«Continuo a espera do dia da escolha
do dia em que haverá algo a escolher
porque no dia que olhei o céu vi o mar
e no dia que vi o mar nesse dia eu vi
um poço que era mais que eu porque me tinha

Continuo a espera do dia da escolha
porque quando eu vi uma árvore 
eu vi minhas próprias veias
e quando eu senti essas veias
eu vi que eu era como o acto de respirar
e foi só daí que me despi para um outro
E me fiz planta, que dá cura para ser feliz

Continuo a espera dum momento em que possa escolher
porque foi desse querer o que faz falta, que cresci
porque enquanto outros sorriam eu vivia para esperar sozinha
E o que todos ignoravam eu procurava para sofrer
E entender, para me fazer refém, de olhos que secretam vida

E sonhei, em vão, que escolhia
porque pensei que enquanto aprendia, acreditava
enquanto dentro de mim era minha mente quem mentia

E cansei de esperar e tentei em vão fugir
enquanto a vida me escolhia e me arrastava
para o lugar da onde até eu própria vim

E os lugares que devo estar me escolhem
e eu não escolho ninguem nem lugar nenhum
e quando o Sol bate em mim só reflete
a única borboleta que minha mente soube desfolhar

E quando a vida se dá eu não sei fazer mais nada
E quando a dor se vai não há mais nada que me faça crescer
Do que ser terra, ser dança, ser curandeira e ser amor
Sendo isso, que é só isso que dou.»

Thursday, November 07, 2013

folha em branco

Quero reescrever a minha história
Reescrever tudo, sendo só história
Reescrever sendo planta, ser puro
Que se nutre, sendo singelo

Quero reescrever esses tons que existem a minha volta
Recolorindo o que perdeu cor
Quero no amor divagar sendo estrela
Estando lá longe numa espera, apenas iluminando

Quero reescrever o acto de sacrificar
Que não seja só causa de dor, que seja para compreenção
Que a ferida possa finalmente secar
E tratada, escolher uma história de amor

Quero voltar a cantar como cantava
Usar a minha capacidade de dentro de mim viajar
Quero não encontrar mais as amarras
Para que a felicidade tua seja tudo o que existe

Quero voltar a ser vida, voltar a dar-me sendo canal
Voltar a aceitar ouvir as vozes que ouço secretamente
Sem criticar o que escuto por dentro
Quando nada da vida restar em mim
Quero que exista algo de mim ligado profundamente a ela.


Não tendo sítio ou pessoa a quem me possa ligar, escrevo-me, e encontro-me comigo em texto,
com o fim de mim a mim desapegar.
E ser gosto do desgosto de ter gosto e prazer em tudo o querer desligar.
Sou só de nada, o desfazer de cada folha de papel, despida nesse ser que quer retornar a ingenuidade - essa metade despida de tudo - estravassar da vida que é tão pura, que nem sou eu nem ninguém.